A História do Cálculo

O Cálculo Diferencial e Integral

A palavra Cálculo vem do latim calculus, que significa pedregulho e é uma reminiscência da técnica primitiva de executar operações matemáticas simples por meio de pequenas pedras. Calculi eram as pessoas que contavam, calculones os professores. Escravos que tinham a função de contadores eram chamados de calculatores enquanto homens livres com a mesma tarefa recebiam a designação de numerarii.

O Cálculo, como o estudo das operações de diferenciação e integração, é o nome de um sistema ou método desenvolvido independentemente em grande parte por Newton e Leibniz no século XVII. O termo cálculo foi usado pela primeira vez por Leibniz em seu livro publicado em 1680, Os Elementos de um novo Cálculo das Diferenças e Somas, Tangentes e Quadraturas, Máximos e Mínimos, Medidas de Linhas, Superfícies e Sólidos e outras coisas que transcendem o cálculo usual.

O Cálculo é o resultado de uma longa série de avanços, iniciados com a geometria grega, na tentativa de estabelecer áreas de figuras com forma arbitrária, volumes de sólidos quaisquer, no estudo do movimento dos corpos e de sua velocidade instantânea bem como, no que consiste o problema inverso, o cálculo das distâncias percorridas conhecida sua velocidade a cada momento. A expressão Cálculo Infinitesimal foi usada por muitos anos como referência ao cálculo. O conceito de infinitesimal como uma quantidade arbitrariamente pequena foi amplamente empregado pelos matemáticos na ausência de uma teoria apropriada para os limites. Este desenvolvimento somente se deu no século XIX. Como conjunto de métodos matemáticos o cálculo se distingue da álgebra elementar e da geometria pela introdução da operação de passagem ao limite. As operações básicas do cálculo são a diferenciação e a integração, sendo ambos os conceitos utilizados em diversas situações tanto teóricas quanto em aplicações na física e engenharia, estatística, economia e em praticamente todas as áreas científicas modernas.

Os Primórdios Gregos

As idéias principais que formam a base do cálculo diferencial e integral foram desenvolvidas durante um longo intervalo de tempo, sendo que os primeiros passos foram dados pelos matemáticos gregos, em particular buscando soluções para problemas geométricos. Para os gregos, e em particular para a escola pitagórica que teve grande influência nas gerações posteriores de pensadores, o número um era considerado um átomo ou mônada formadora de todos os outros números. Desta forma os demais números eram compostos por uma quantidade de uns ou razões, entendidas como a divisão entre segmentos de comprimento inteiro. Daí o apreço pelos racionais e a dificuldade em aceitar números que não pertencem a este conjunto, como o número \(\pi\) ou \(\sqrt{2}\). Neste sentido eles acreditavam que nem todos os comprimentos pudessem ser representados por números. Tampouco trabalhavam com números negativos e não possuiam grande desenvolvimento em álgebra.

Zenão de Eléia (~450 a.C.) foi um dos primeiros pensadores a propor problemas baseados no conceito de infinito. Segundo um paradoxo famoso imaginado por ele, se uma flecha é atirada do ponto \(A\) até o ponto \(B\) ela deverá passar pela metade do caminho, digamos pelo ponto \(B_1\) , antes de chegar ao destino \(B\). Mas, antes de chegar a \(B_1\) deverá passar por \(B_2\) , o ponto médio entre \(A\) e \(B_1\) , e assim sucessivamente, realizando um número infinito de etapas em um intervalo finito de tempo. Desta forma ele concluiu que o movimento era impossível. Sabemos hoje que o conceito de limite é o que falta para a plena compreensão do paradoxo. Leucipo, Demócrito e Antífon fizeram contribuições para o método de exaustão mais tarde aprimorado por Eudóxo (~370 a.C.) e Arquimedes. O método é assim chamado porque as áreas medidas são tomadas em aproximações sucessivas e crescentes até que cubram a figura considerada.

Na visão de alguns historiadores o verdadeiro precursor do cálculo foi Arquimedes que viveu de 287 até 212 a.C. e, segundo se acredita, foi aluno de Euclides em Alexandria. Arquimedes aperfeiçoou o método da exaustão para a prática da integração buscando encontrar áreas de figuras planas. Em seu livro A Medida do Círculo ele mostrou que o valor exato do número \(\pi\) está entre \(\frac{310}{71}\) e \(\frac{31}{7}\) , aproximação que obteve inscrevendo e circunscrevendo o círculo em um polígono regular de 96 lados. Ele também descreveu uma técnica para o cálculo de raízes e inventou um sistema para a expressão de números grandes. Em O Contador de Areia (ou O Arenário) ele sugeriu um sistema de notação numérica capaz de expressar números até \(8\times 10^{63}\) argumentando que este é um número suficientemente grande para contar todos os grãos de areia do universo. Para estimar as dimensão do universo ele se baseava no sistema de Aristarco, que tinha o Sol no centro do sistema planetário que incluia a Terra.

Arquimedes também enunciou teoremas fundamentais concernentes ao centro de gravidade de figuras planas e sólidos. Seu teorema mais famoso, o chamado Princípio de Arquimedes, permite o cálculo do peso de um objeto imerso em água. Mais tarde ele introduziu algumas das contribuições mais significativas feitas na Grécia. Em primeiro lugar mostrou que a área de um segmento de parábola é \(\frac{4}{3}\) da área de um triângulo de mesma base e vértice e \(2/3\) da área de um paralelogramo circunscrito. Arquimedes construiu uma sequência infinita de triângulos partindo de um triângulo com área \(A\) e somando repetidamente novos triângulos entre os existentes e a parábola, até chegar a
$$A,\,A+\frac{1}{4},\,A+\frac{1}{4}+\frac{1}{16},\,A+\frac{1}{4}+\frac{1}{16}+\frac{1}{64},\ldots$$

A área do segmento de parábola é, portanto
$$ A \left( 1+\frac{1}{4} + \frac{1}{4^2} + \frac{1}{4^3} + \ldots \right) = A\sum_{n=0}^{\infty} = \frac{1}{4^n}= \left( \frac{4}{3} \right) A $$

Este é o primeiro exemplo histórico da soma de uma série infinita. Arquimedes também usou o método da exaustão para calcular aproximadamente a área de um círculo, no que consiste em um exemplo bem antigo do uso da integração para uma avaliação aproximada do número \(\pi\).

Figura 1: Quadratura do círculo e da parábola

Usando este método Arquimedes foi capaz de calcular o volume da esfera, o volume e a área do cone, a superfície subentendida por uma elipse, o volume obtido por revolução de qualquer segmento de uma parábola ou hipérbole.

Conta-se que Arquimedes estava fazendo contas na areia quando foi morto por um soldado romano.

Arquimedes foi morto em 212 a.C. quando Siracusa foi tomada pelos soldados romanos durante a Segunda Guerra Púnica apesar da ordem expressa do imperador romano para que sua vida fosse poupada. Esta morte se tornou um símbolo da destruição da civilização grega e de seu ímpeto na busca de resposta para questões científicas e filosóficas. Estes eventos determinaram, pelo menos parcialmente, a entrada da civilização ocidental em um longo período de estagnação cultural durante os princípios da Idade Média.

Desenvolvimento na Idade Média e Renascimento

(1) Apesar disto durante a Idade Média os algarismos hindu-arábicos foram difundidos na Europa, em particular devido ao trabalho de Fibonacci e alguns avanços sobre a solução de equações de segundo e terceiro grau foram obtidos.
(2) Uma crença derivada das idéias platônicas e pitagóricas.

Com o progresso das invasões romanas e o declínio geral da civilização grega a matemática passou por longos anos sem receber aprimoramentos importantes. A civilização romana era voltada para o uso pragmático da matemática e poucas descobertas marcaram este período. Mais tarde, com a expansão do império, tornou-se difícil mantê-lo unificado, o que motivou sua separação em império do ocidente, dirigido por Roma, e império bizantino, com sede em Constantinopla. O enfraquecimento do poder de Roma, as invasões dos germanos e outros povos vindos do norte da Europa, e o fortalecimento da igreja romana deram origem ao período conhecido como Idade Média, durante o qual grande parte dos textos científicos e filosóficos foi destruída e a cultura clássica foi quase totalmente esquecida(1). Esta situação durou até o final do século XVI d.C. com o Renascimento, caracterizado pelo avivamento do interesse pelos problemas relacionados ao movimento, tais como o estudo dos corpos em queda livre e de centros de gravidade. As idéias principais que se sucederam na formação da base do cálculo foram desenvolvidas durante um longo intervalo de tempo.

Luca Valério (1552-1618), um doutor em filosofia e teologia, publicou em Roma, 1604, seu livro De centro gravitatis onde empregava os métodos de Arquimedes para calcular volumes e centros de gravidade de corpos sólidos. Em 1606 ele publicou De quadratura parabolae onde empregava os métodos gregos para calcular áreas de figuras planas. Valério se encontrou com Galileu Galilei na cidade de Pisa em 1590 e iniciou com ele uma troca de correspondência. Em 1916 o Cardeal Belarmino, o principal teólogo da igreja Católica Romana da época, emitiu uma declaração oficial de que eram falsas as idéias de Copérnico e Valério se viu obrigado a interromper seu contato com Galilei, um dos principais defensores das idéias copernicanas.

Johannes Kepler

Kepler (1571-1630) também era um homem profundamente religioso que acreditava ser uma obrigação cristã a tarefa de compreender e revelar os segredos de Deus. Ele defendia que o ser humano, sendo feito a imagem de seu criador, deveria ser capaz de entender o Universo por ele criado e que a criação de tudo havia sido elaborada sobre um plano matemático(2). Uma vez que a matemática era, já na época, tida como um instrumento eficaz de se chegar à verdade, ele elaborou sua estratégia para a obtenção do conhecimento.

Em seu estudo sobre o movimento planetário Kepler precisava encontrar a área de setores de uma elipse. Seu método consistia em considerar as áreas como uma soma de linhas, outra forma primitiva de abordar uma integração. No entanto Kepler não se esforçou para manter um grande rigor em seu trabalho, tendo cometido erros que, por sorte, se cancelavam permitindo a obtenção de resultados corretos. Há um relato de que, durante a cerimônia de seu segundo casamento em 1613, Kepler teria notado que o volume dos barris de vinho era calculado por meio de uma barra inserida pelo orifício do barril para medir sua diagonal. Ele passou a considerar como este método poderia funcionar e, como resultado de suas meditações, publicou diversos artigos sobre volumes de sólidos de revolução. Seus métodos foram aperfeiçoados por Cavalieri e constituem parte importante do legado ancestral do cálculo diferencial.

As próximas contribuições importantes foram alcançadas por três matemáticos nascidos aproximadamente na mesma época: Cavalieri, Roberval e Fermat. O primeiro deles, Bonaventura Cavalieri (1598 – 1647), se tornou jesuíta quando ainda era criança e estudou em um monastério de Pisa. Assim como ocorreu com Luca Valério, seu interesse pela matemática foi despertado pelo estudo das obras de Euclides e seu contato com Galileu, de quem ele se considerava discípulo.

Em 1629 Cavalieri foi indicado como professor de matemática em Bologna. Nesta época ele já tinha desenvolvido seu método dos indivisíveis para o cálculo de áreas, um fator importante para o desenvolvimento do cálculo integral. A teoria dos indivisíveis de Cavalieri, apresentada em 1635 era um aprimoramento do método da exaustão de Arquimedes, incorporando a teoria das quantidades geométricas infinitesimalmente pequenas de Kepler. Por meio desta teoria Cavalieri podia calcular de forma prática e eficiente a área e volume de diversas figuras geométricas. Ele não era muito rigoroso em seu trabalho e não é fácil hoje entendermos como ele concebia seu método. Aparentemente Cavalieri considerava uma área como composta de componentes que eram retas e, a partir dai, somava um número infinito de “indivisíveis”. Usando esta técnica ele mostrou que a área sob a curva \(x^n\) avaliada de \(0\) até um número arbitrário \(a\) era \(a^{n+1}/(n+1)\) mostrando inicialmente que o resultado valia para alguns valores de \(n\) e depois inferindo sua validade para o caso geral.

(3) Os logaritmos foram inventados por John Napier (também conhecido por Neper) e aperfeiçoados por Briggs no século XVII.
(4) Marin Mersenne (1588-1648, França) foi um padre católico responsável pela formação de um grupo de debates envolvendo matemáticos importantes da época, tais como Fermat, Pascal, Roberval e outros que, mais tarde, formaram o núcleo da Academia Francesa. Mersenne se correspondia com diversos pensadores importantes e foi o responsável pela divulgação de suas idéias, algumas vezes contra a vontade do próprio pensador. Ele defendeu Descartes e Galileu contra os ataques teológicos e se esforçou para denunciar como pseudo-ciências as práticas da alquimia e astrologia.

Como resposta às críticas de que seus métodos não possuíam um embasamento teórico muito rigoroso Cavaliere publicou Exercitationes geometricae onde aperfeiçoava os fundamentos de sua teoria. Este texto se tornou a principal fonte de estudos dos matemáticos do século XVII. Cavalieri foi também um dos grandes responsáveis pela introdução dos logaritmos(3) na Itália como um instrumento computacional, tendo publicado tabelas de logaritmos e funções trigonométricas para uso dos astrônomos da época. Cavalieri também escreveu sobre as seções cônicas, trigonometria, óptica, astronomia e astrologia.

Gilles Personne de Roberval (1602-1675, França) iniciou seus estudos de matemática com 14 anos de idade. Ele viajou por toda a França fazendo contato com matemáticos da época e foi um dos pensadores sob influência do grupo de Mersenne(4). Roberval considerou problemas do mesmo tipo que os de Cavalieri embora procurasse manter maior rigor que ele. Assim como fazia Torricelli, ele procurou descrever uma curva plana como um movimento gerado por um ponto cujo movimento se pode decompor em dois movimentos conhecidos, o que corresponde à descrição moderna de uma curva sob forma paramétrica. A resultante das velocidades dos dois movimentos conhecidos fornece a tangente da curva em cada ponto. Roberval desenvolveu métodos para a integração escrevendo Traité des indivisibles onde apresenta o cálculo da integral definida da função sen x. Ele também calculou o comprimento de arco de uma espiral, trabalhou com ciclóides e apresentou a descrição de diversas curvas planas, desenvolvendo um método já sugerido por Torricelli para se traçar retas tangentes a curvas dadas. Ele considerava a área entre uma curva e uma reta como sendo composta por um grande número de faixas muito estreitas. Usando este processo na avaliação da área sob de \(x^n\) de \(0\) até \(1\) ele obteve o valor aproximado de
$$ \frac{1}{n^{m+1}} \left( 0^m + 1^m +2^m + \ldots +(n-1)^m \right) $$

e mostrou depois, aplicando técnicas precursoras do conceito de limite, que este valor tendia para \(\frac{1}{m+1},\) calculando desta forma a área procurada.

Pierre de Fermat

Pierre de Fermat (1601-1665, França) também procurou trabalhar com rigor, embora não tenha fornecido provas de suas afirmações e nem mostrado de forma clara quais foram os métodos empregados para se obter um determinado resultado. Ele se formou em Direito pela Universidade de Toulouse mas logo se interessou pela matemática praticamente como um amador, estudando em suas horas vagas. Em 1629 ele produziu uma restauração da obra de Apolônio, Plane loci e, na mesma época, escreveu um trabalho importante sobre máximos e mínimos de funções procurando pelos pontos onde as tangentes às suas curvas são paralelas ao eixo \(Ox\). Ele escreveu a Descartes descrevendo seu método, que era essencialmente o mesmo usado hoje que consiste em encontrar pontos de derivada nula. Devido a este episódio Lagrange afirmou considerar Fermat o inventor do cálculo.

Fermat considerou parábolas e hipérboles generalizadas do seguinte modo:

$$ \mbox{Parábolas: } \frac{y}{a} = \left( \frac{x}{b} \right)^2 \mbox{ generalizando para } \left( \frac{y}{a} \right)^n = \left( \frac{x}{b} \right)^m, $$

$$ \mbox{Hipérboles: } \frac{y}{a} = \frac{b}{x} \mbox{ generalizando para } \left( \frac{y}{a} \right)^n = \left( \frac{b}{x} \right)^m. $$

(5) Euclides mostrou que a expressão de Pitágoras \(x^2+y^2=z^2\) admite infinitas soluções inteiras, os ternos pitagóricos.

Enquanto examinava expressões como \(\frac{y}{b} = \left( \frac{x}{b} \right)^p\), Fermat calculou a soma de \(r^p\) de \(r=1\) até \(r=n\). No período de 1643 até 1654 Fermat esteve em contato com seus colegas cientistas em Paris, sob a influência de Mersenne. Surgiu então o seu interesse pela teoria dos números. Ele se tornou amplamente conhecido particularmente pelo que hoje conhecemos como último Teorema de Fermat que afirma que a expressão \(x^n+y^n=z^n\) não admite solução(5) inteira diferente de zero para \(n≥3.\) Fermat escreveu na margem de seu livro Aritmetica de Diofante: “descobri uma prova realmente maravilhosa para este teorema mas estas margens são estreitas demais para contê-la” . Acredita-se hoje que a prova de Fermat, se existiu, era incorreta. As tentativas de demonstração do teorema motivaram muitas gerações de matemáticos e deu origem a diversas novas áreas na matemática, particularmente na álgebra. Apesar disto o teorema permaneceu sem demonstração por séculos, problema que só foi resolvido em 1994 pelo matemático inglês Andrew Wiles.

Além de sua contribuição fundamental para a geometria analítica René Descartes (1596-1650, França) foi responsável pelo desenvolvimento de um método para a determinação de normais, publicado no livro La Géométrie, 1637. Este livro é considerado o mais importante de seus trabalhos em matemática devido à inserção do formalismo algébrico na geometria. Nele se toma o primeiro passo na direção da teoria dos invariantes que remove a arbitrariedade de escolha de um referencial. A adoção do formalismo algébrico no tratamento da geometria torna possível a consideração de problemas que seriam difíceis ou impossíveis sem esta técnica.

René Descartes

De Beaune ampliou o método de Descartes e o aplicou à determinação de tangentes. Hudde descobriu um método mais simples, hoje conhecido como Regra de Hudde, onde as tangentes são obtidas através das derivadas. Tanto o trabalho de Descartes quanto o de Hudde foram de primordial importância para influenciar Newton e conduzi-lo a sua formulação do Cálculo.

Huygens foi um crítico das provas apresentadas por Cavalieri. Ele afirmava que é necessário pelo menos produzir uma prova que, mesmo que incompleta, leve à convicção de que uma prova posterior, totalmente rigorosa, possa ser estabelecida. Ele exerceu uma influência profunda em Leibniz e, através deste, representa papel importante na construção de uma abordagem mais satisfatória do cálculo.
fig Triângulo de Barrow

Os esforços de Torricelli e Barrow representam os passos seguintes de maior importância. Barrow foi o responsável pelo método de construção de tangentes a uma curva como o limite de uma corda secante quando os pontos que a definem se aproximam um do outro. Este método é conhecido como o triângulo diferencial de Barrow.

Tanto Torricelli como Barrow trataram do problema do movimento com velocidade variável. A derivada da distância em função do tempo é uma velocidade, enquanto a operação inversa permite que, conhecida a função velocidade a cada instante se possa obter, por integração, a distância percorrida. A partir dai foi desenvolvido o conceito de integração como o inverso da diferenciação. Barrow compreendia que a derivada e a integral são processos complementares, um o inverso do outro. Embora Barrow nunca tenha afirmado explicitamente o teorema fundamental do cálculo ele estava trabalhando nesta direção. Coube a Newton, que foi aluno de Barrow, continuar este trabalho e fazer a primeira afirmação explícita do teorema.

Isaac Newton

“Platão é meu amigo, Aristóteles é meu amigo, mas a Verdade é a minha melhor amiga.”
Isaac Newton (1643 – 1727)

Issac Newton (1642-1727) nasceu no ano da morte de Galileu Galilei em Woolsthorpe, Inglaterra. Ele veio de uma família abastada, embora seu pai fosse um homem com pouca educação formal. Newton teve uma infância infeliz, não tendo conhecido seu pai que morreu antes que ele completasse um ano de idade. Sua mãe, Hannah Ayscough, se casou com o ministro da igreja de um vilarejo próximo e o jovem Isaac foi deixado com seus avós. Há indícios de que Newton sofreu de forte ressentimento pelo casamento da mãe, ao mesmo tempo em que não desenvolveu vínculos fortes com os avós.

Com a morte do padrasto em 1653, Newton passou a viver com a mãe, avó, um meio-irmão e duas meia-irmãs. Como estudante ele demonstrava poucas habilidades e interesse e, por isto, foi tirado da escola para cuidar dos interesses financeiros de sua mãe. Newton também não mostrou interesse em realizar esta tarefa. Em 1960, por influência de William Ayscough, tio de Newton, a família decidiu prepará-lo para a educação superior. Nesta época ele se alojava com a família de Stokes, o chefe da escola, que percebendo os talentos de Newton, foi um dos responsáveis por convencer a família de que ele possuía habilidades para o trabalho acadêmico.

Pouco se conhece sobre o que Isaac teria aprendido antes de ingressar na universidade, particularmente em matemática. Com certeza ele recebeu de Stokes um bom impulso e orientação e é possível que tenha tido o primeiro contato com Os Elementosde Euclides nesta época. Há um número de pequenas histórias, sem maior comprovação, de que Newton era hábil com as máquinas e gostava de construir modelos de relógios e moinhos.

Finalmente, em 1661, quando já era mais velho que a maioria dos colegas, Newton ingressou no Trinity College de Cambridge. Apesar de sua posição financeira confortável ele entrou como um sizar, uma espécie de posição de serviçal em relação aos outros colegas. Newton pretendia inicialmente se formar em Direito.

O currículo em Cambridge naquela época era dominado pelos estudos da filosofia aristotélica até o terceiro ano. A partir dai Newton se dedicou a estudar os textos de Descartes, Gassendi, Hobbes e, em particular, de Boyle. Ele também mostrou interesse pelas teorias revolucionárias de Copérnico, Kepler e Galileu em astronomia e ótica. Gradualmente ele se envolveu com o estudo da matemática e da física. Existe um relato, por parte de de Moivre, de que seu interesse pela matemática foi incrementado em 1663 quando comprou um livro de astronomia e não pode entender a matemática envolvida. Dai ele passou a fazer um esforço para aprimorar seu conhecimento desta disciplina, principalmente através do estudo de uma versão de Barrow de Os Elementos de Euclides. Em seguida ele passou a estudar a recém desenvolvida geometria analítica através dos textos de Viète e René Descartes. Neste período ele aprendeu sobre o método de Wallis para encontrar um quadrado com área sob segmentos da parábola e da hipérbole, usando os indivisíveis.

Ao receber sua graduação em abril de 1665 Newton não havia ainda mostrado toda a sua genialidade. Em 1665 a universidade foi fechada por causa da epidemia da peste negra (peste bubônica) que se espalhava por toda a Europa e Inglaterra. Newton se recolheu na casa de sua mãe onde aprofundou, por conta própria, seus estudos e investigações. Com menos de 25 anos de idade ele iniciou sua carreira fazendo contribuições importantes para a matemática, mecânica, ótica e astronomia. Neste período, como ele próprio relatou depois, ele fez quatro de suas grandes descobertas: o teorema binomial, o cálculo, a lei da gravitação universal e a natureza das cores. O método dos fluxos, como ele denominava o cálculo, estava baseado no reconhecimento fundamental de que as operações de derivação e integração estavam associadas, sendo simplesmente uma a operação inversa da outra. Partindo da derivação com operação básica ele desenvolveu técnicas analíticas que unificavam diversas abordagens anteriores para solucionar questões que antes se julgava serem não correlacionadas, tais como o cálculo de áreas, tangentes a curvas, comprimento de segmentos de curvas e a localização de máximos e mínimos de funções.

Quando a Universidade de Cambridge reabriu, ao término da peste negra em 1667, Newton foi aceito como professor no Trinity College. Nesta época se iniciaram os esforços de Barrow para divulgar os resultados obtidos por Newton que mantinha um contato bastante restrito com a comunidade científica de sua época. Aparentemente por receio às críticas e ao plágio ele tendia a não expor de pronto os seus métodos e, quando o fazia, não os relatava com clareza.

Em outubro de 1666 Newton escreveu um tratado sobre os fluxos. Seu trabalho não foi imediatamente publicado mas muitos matemáticos da época o conheciam de forma que o tratado exerceu grande influência sobre o desenvolvimento do cálculo naquele período. Ele iniciou suas considerações tratando uma curva como sendo a trajetória de uma partícula, dada por suas coordenadas em função do tempo. Em linguagem moderna ele representava a curva de uma função sob a sua forma paramétrica, usando o tempo como parâmetro – uma forma bastante apropriada para quem deseja estudar o movimento de uma partícula. A velocidade no sentido horizontal \(\dot{x}\) e a velocidade vertical \(\dot{y}\) eram os fluxos de \(x\) e \(y\) associados à passagem do tempo. Com esta notação \(\frac{\dot{y}}{\dot{x}}\) representa a tangente à curva \(f(x,y)=0\).

Em seu tratado de 1666 Newton discute a problema inverso. Dada a relação entre \(x\) e \(\frac{\dot{y}}{\dot{x}}\) procurava-se encontrar \(y\). Desta forma a inclinação da tangente era dada para cada \(x\). Considerando conhecida a inclinação a cada instante, Newton resolvia o problema por antidiferenciação (integração). Ele também usou o mesmo processo para calcular áreas e, pela primeira vez na história, ele afirma claramente o Teorema Fundamental do Cálculo, que estabelece a conexão entre os processos de derivação e de integração.

Em 1671 Newton escreveu De Methodis Serierum et Fluxionum mas não o conseguiu publicar até que John Colson preparou uma tradução para o inglês em 1736. Newton encontrou diversas dificuldades para publicar seu textos em matemática e, de certa forma, Barrow tinha parte da responsabilidade por isto. Em tempos recentes os editores de Barrow tinha ido a falência e os demais editores se encontravam receosos em continuar a publicação de textos sobre matemática. O livro de Newton sobre Análise contendo um tratamento das séries infinitas foi escrito em 1669 e circulou pelos meios acadêmicos em forma manuscrita, só sendo publicado em 1711. Da mesma forma seu Method of fluxions and infinite series foi escrito em 1671 e somente traduzido para o inglês e publicado no ano de 1736. O original em latim só foi publicado muitos anos mais tarde.

Nestas duas obras Newton encontrou as expansões em séries de potências para as funções \(\mbox{sen}{x}\) e \(\cos{x}\) assim como a expansão para a função que hoje conhecemos como função exponencial. Naquele tempo não havia uma definição clara desta função, o que foi estabelecido bem mais tarde por Euler, também o responsável pela atual notação, \(e^x\). As expansões em séries de potências para funções analíticas são hoje conhecidas como séries de Taylor ou de Maclaurin, dependendo do ponto em torno dos quais são consideradas. Através das expansões em séries de potência para cada função

$$f(x) = a_0 + a_1 x + a_2 x^2 + \ldots + a_n x^n + \ldots $$

Newton resolveu o problema da quadratura, ou seja, o de encontrar áreas subentendidas pelas curvas destas funções, fazendo a integração termo e termo,
$$\int f(x)dx = a_0 x + \frac{a_1}{2} x^2 + \frac{a_2}{3} x^3 + \ldots + \frac{a_n}{n+1} x^n+1 + \ldots,$$
o que, como hoje se sabe, somente está correto se a série é convergente.

A obra seguinte de Newton, Tractatus de Quadratura Curvarum, foi escrito em 1693 e só publicado em 1704 sob a forma de um apêndice em seu livro Optiks. O Tractatus contém uma outra abordagem que envolve uma operação primitiva de tomar limites. Para ilustrar o método de Newton suponha, por exemplo, que queremos derivar a função \(y=x^2\). Lembrando que ele tratava as variáveis sob a forma \(x(t)\) e \(y(t)\), nas palavras de Newton “devido ao fluxo de \(x\) com a passagem do tempo”, quando o tempo progride de uma quantidade \(o\), as variáveis mudam da seguinte forma
$$ x = x(t), \;\; x \to x + \dot{x}o, $$
$$ y = y(t), \;\; y \to y + \dot{y}o. $$

Dada a relação entre \(x\) e \(y\) (\(y=x^2\), neste caso)
$$y \to y + \dot{y}o = \left(x + \dot{x}o\right)^2 = x^2 + 2 x \dot{x}o + \dot{x}^2 o^2,$$
$$\dot{y} o = 2 x \dot{x}o + \dot{x}^2 o^2 \Rightarrow \dot{y} = 2 x \dot{x} + \dot{x}^2 o.$$

Tomando \(o = 0\), no que deveria ser um limite, obtém-se \(\dot{y} o = 2x\dot{x}\). A taxa de variação de \(y\) com \(x\), que é a inclinação da reta tangente, é \(\frac{\dot{y}}{\dot{x}} = 2x\).

Como professor Lucasiano, o primeiro trabalho de Newton foi um curso dedicado à ótica, iniciado em janeiro de 1670. Neste curso ele ensinava que a luz branca não é uma entidade simples mas sim composta por luz de diversas cores, como se pode observar no espectro obtido por meio de um prisma. Vale ressaltar que, desde Aristóteles, sempre se acreditou no contrário. A observação do efeito de aberração cromática em telescópios levou Newton a esta conclusão, bem como à sugestão da construção de telescópios refletores, que se utilizam de espelhos parabólicos no lugar de lentes para a obtenção de uma imagem ampliada dos objetos celestes.

Em 1672 Newton foi aceito membro da Royal Society e publicou seu primeiro artigo sobre a luz e a cor no periódico Philosophical Transactions of the Royal Society. Este artigo foi bem aceito pela comunidade científica mas também deu origem a críticas e oposições. Hooke e Huygens argumentaram contra a tentativa de Newton de provar que a luz possuía natureza corpuscular e não ondulatória. Devido ao peso da opinião de Newton este foi um erro que persistiu por muito tempo no estudo da luz até que experiências com o fenômeno da refração, no século XIX, indicaram uma preferência pelo modelo ondulatório. Vale dizer que hoje existe um modelo corpuscular da luz, e da radiação eletromagnética em geral, como parte integrante da moderna teoria quântica. No entanto, nenhum dos fenômenos de que fato evidenciam a natureza corpuscular da luz era conhecido na época de Newton. As críticas recebidas levaram Newton a adotar uma posição ainda mais retraída e ser mais reticente com relação a suas descobertas. Embora apreciasse a notoriedade ele ressentia enormemente as críticas recebidas e julgava que uma forma de evitá-las seria evitar a publicação de suas idéias.

Cópia de Newton de seu próprio livro Princípia, com correções de seu punho para a segunda edição.

As relações de Newton com Hooke se deterioraram em 1675, quando Hooke o acusou de plágio em algumas de suas conclusões em ótica. Isto fez com que Newton adiasse a publicação de suas conclusões em ótica até a morte do adversário, em 1703. O livro Opticks só apareceu em 1704, tratando da teoria da luz e da cor.

Por volta de 1678, em parte devido a uma nova discussão com os jesuítas sobre sua teoria da luz e devido à morte de sua mãe, Newton sofreu seu primeiro colapso nervoso. Muitos historiadores sustentam a tese de que seu envolvimento com as experimentações alquímicas e subseqüente exposição a vapores de mercúrio e outros metais teria contribuído para fragilizar seu sistema nervoso. é certo que ele passou grande parte de sua vida estudando alquimia, religião cronologia do Apocalipse e outros temas esotéricos, tendo escrito diversos tratados sobre estes assuntos.

As maiores contribuições de Newton para a física foram suas descobertas sobre a mecânica e a gravitação universal. Partindo de sua própria compreensão de forças centrífugas e da terceira lei de Kepler para o movimento planetário ele deduziu que duas partículas de massa \(m_1\) e \(m_2\) respectivamente se atraem com intensidade diretamente proporcional a suas massa e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre elas,
$$ F = G \frac{m_1 m_2}{r^2}.$$

Ele foi o responsável pelo entendimento de que a força que age sobre a Lua, por exemplo, é a mesma força que atrai uma maçã para o chão, nas proximidades da superfície. Este entendimento, simples para a mente moderna, representou um grande passo dentro de um contexto cultural que predominantemente acreditava que os objetos celestes eram de natureza divina, em oposição aos de natureza terrena, e que não deveriam obedecer às mesmas leis. Ele representa uma grande unificação de princípios, assim como aquela obtida mais tarde por Maxwell e outros físicos na unificação das teorias da eletricidade e do magnetismo.

Em 1686 Halley, astrônomo e amigo de Newton, o convenceu a publicar uma descrição completa de suas descobertas sobre física e astronomia. Um ano mais tarde ele publicou o Philosophiae Naturalis Principia Mathematica, ou simplesmente Principia, como se tornou conhecido o livro. Este é considerado por muitos historiadores da ciência como o maior livro científico já escrito. Nele Newton trata do movimento dos corpos em meios resistentes e não resistentes e sob a ação de forças centrípetas. Os resultados podem ser aplicados a órbitas celestes, projéteis, pêndulos e corpos em queda livre nas proximidades da superfície da Terra. Em seguida Newton forneceu explicações sobre as órbitas excêntricas dos cometas, as marés e suas variações, a precessão do eixo da Terra e a perturbação do movimento da Lua pela atração gravitacional do Sol. Este trabalho o transformou no principal cientista de sua época embora diversos pensadores da Europa continental e da própria Inglaterra relutassem em aceitar suas visões sobre a gravitação como ação à distância, sua teoria corpuscular da luz, sua versão do cálculo em contraposição à versão de Leibniz e outros tópicos localizados.

Em 1685 James II se tornou rei da Grã-Bretanha, se convertendo ao catolicismo em 1669. Em seguida ele passou a nomear apenas católicos para cargos nas forças armadas e outros postos oficiais de estado. Posteriormente o rei passou a preencher postos vagos na Universidade de Cambrigde com catedráticos fiéis à Igreja Católica. Quando ele insistiu para que um monge beneditino recebesse os graus acadêmicos sem a necessidade de prestar exames ou proferir os juramentos de praxe na época, Newton assumiu a posição de opositor declarado do rei, uma disputa que durou até a fuga de James II e a tomada do poder por William de Orange. Newton, já visto como o maior matemático de sua época, agora famoso pela firme defesa da Universidade, foi eleito para um cargo político no Parlamento. Isto resultou em sua mudança para Londres, com o conseqüente afastamento de Cambridge e das atividades acadêmicas.

Em 1693 Newton sofre um segundo colapso nervoso e abandona suas atividades de pesquisa. Desta vez, além do envenenamento por metais, podem ter contribuído o descuido com os hábitos alimentares, uma frustração com o impacto de suas pesquisas no meio acadêmico e a dificuldade em se relacionar com os colegas, muitas vezes advindas de diferenças em suas convicções religiosas. Além disto houve o rompimento de uma amizade pessoal com Fatio de Duillier, um matemático suiço que residia em Londres. é provável que ele tenha sofrido de depressão durante grande parte de sua vida.

Em 1696 Newton foi designado para o cargo de Guardião da Casa da Moeda, mais tarde Mestre da Casa da Moeda. Ele coordenou com grande eficiência um período difícil de recunhagem da moeda, necessário devido ao grande volume de moeda falsa em circulação na época. Além de eficiente Newton foi rígido na perseguição e punição dos falsificadores.

Em 1703 Newton foi eleito presidente da Royal Society, mantendo este cargo até o final de sua vida. Em 1705 ele foi feito cavalheiro pela rainha Anne, sendo o primeiro cientista a receber esta distinção como reconhecimento por seu trabalho. Contudo toda a última fase de sua vida foi dominada pelo ressentimento causado pela controvérsia com Leibniz sobre a autoria da Cálculo.

Gottfried Wilhelm von Leibniz

Gottfried Leibniz (1646-1716)

Leibniz (1646-1716) nasceu em Leipzig, Alemanha, filho de Friedrich Leibniz, um professor de filosofia moral e cristão fervoroso e Catharina Schmuck. Leibniz perdeu o pai com apenas seis anos e aprendeu da mãe os valores religiosos e éticos que nortearam sua vida e filosofia. Na escola ele aprendeu a lógica de Aristóteles. Insatisfeito com a filosofia aristotélica dominante na época ele iniciou o desenvolvimento de suas próprias idéias sobre como aperfeiçoá-la. Ainda criança ele apreciava ler os livros de seu pai sobre metafísica e teologia nas visões de escritores católicos e protestantes. O próprio Leibniz reconheceu mais tarde como uma constante em sua vida a preocupação em estabelecer um ordenamento por trás do pensamento lógico e da dedução matemática, assim como uma tentativa sempre presente de estabelecer contatos entre pontos de vista conflitantes e o de unificar os diversos sistemas de pensamento.

Ao completar 16 anos, algo não muito incomum na época, Leibniz entrou para a Universidade de Leipzig onde estudou filosofia e matemática. Nenhuma destas disciplinas era, na época, ensinada com grande nível de aprofundamento. Após sua graduação, obtida em 1663, ele passou um período em Jena estudando com com Erhard Weigel, um filósofo e matemático com quem aprendeu a importância do método de provas matemáticas em assuntos tais como lógica e filosofia. Em 1663 Leibniz retornou a Leipzig para o programa de doutorado em Direito. Lá ele obteve primeiro o grau de Mestre em filosofia, tendo sido mais tarde recusado para o grau de doutor em Direito. Aparentemente isto ocorreu porque ele era muito jovem e havia na época poucos orientadores disponíveis. Se esperava então que ele aguardasse um ano até sua aceitação. Ao invés de esperar Leibniz foi para a Universidade de Altdorf, recebendo o grau de doutor em Direito em 1667.

Uma vez formado Leibniz iniciou uma carreira voltada para a diplomacia enquanto participava em diversos projetos científicos, literários e políticos. Ele se relacionava igualmente bem com católicos e luteranos e manteve durante toda a sua vida um interesse em trabalhar para a reunificação das igrejas. Outro de seus projetos permanentes era a intenção de reunir de forma organizada todo o conhecimento acumulado até a sua época. Simultaneamente Leibniz começou a estudar o movimento buscando explicar os resultados obtidos por Wren e Huygens sobre colisões elásticas. Em 1671 ele publicou Hypothesis Physica Nova onde afirmava, em acordo com Kepler, que o movimento é decorrente da ação do espírito sobre a matéria. Neste período, passou a se comunicar com Oldenburg, o secretário da Royal Society de Londres, um dos responsáveis por seu contato com Isaac Newton.

Diferente de Newton, Leibniz apreciava viajar pela Europa fazendo contatos com outros matemáticos e filósofos, se aproveitando para isto de sua posição como diplomata. Juntamente com sua atuação na diplomacia ele iniciou suas primeiras tentativas para construir uma máquina calculadora. Em Paris, no anos de 1672, Leibniz estudou matemática e física com Christian Huygens de quem recebeu a sugestão de trabalhar com séries. Em 1673 Leibniz visita a Royal Society em Londres onde apresentou sua tentativa incompleta de construir sua calculadora. Nesta ocasião, em contatos com Hooke, Boyle e Pell ele se atualizou sobre os resultados mais recentes obtidos em séries. Mais tarde, embora ausente de Londres, Leibniz recebeu críticas na Royal Society, especialmente no que se referia à máquina de calcular. Estas críticas tiveram um efeito interessante sobre Leibniz. Ele percebeu que seus conhecimentos em matemática eram, de fato, incompletos e que necessitavam de aprimoramento. Sem se abater ele redobrou seus esforços se aprofundar nesta disciplina.

Leibniz foi aceito membro da Royal Society de Londres em 1673 e iniciou um estudo sobre a geometria dos infinitesimais, trocando correspondência sobres estes esforços com Oldenburg que, por sua vez, o informou sobre os avanços de Newton nesta área. Deve-se notar que, neste período, Leibniz não gozava de grande reputação com os membros Royal Society devido à sua incapacidade de concluir sua máquina calculadora. Simultaneamente Oldenburg desconhecia que ele havia, devido a seus esforços para se superar, se transformado em um gênio criativo da matemática.

Em Paris, na mesma época, Leibniz começou a desenvolver os princípios de sua versão do cálculo. Consciente de que, para o pleno desenvolvimento de uma ferramenta matemática, era necessária a adoção de uma notação consistente e de fácil manipulação ele dedicou um bom tempo para o estabelecimento de sua notação que é basicamente a mesma que usamos até hoje. é sabido que suas primeiras anotações eram confusas e de difícil leitura. Já em 1675 ele escreveu um artigo manuscrito onde usava pela primeira vez a notação \(f(x)dx.\) No mesmo artigo ele apresentou a regra para a diferenciação de um produto. Em 1676 Leibniz apresentou o conceito de diferencial, inclusive escrevendo
$$dx^n = n x^{n-1}dx,$$

para \(n\) inteiro ou fracionário.

Em 1696 Leibniz aceitou um cargo na biblioteca de Hanover, onde ficou até o fim de sua vida. Ele continuou mantendo contato com outros matemáticos da época e viajando pela Europa. Outros projetos foram iniciados neste período, tais como moinhos bombeadores de água para serem empregados em minas nas montanhas de Harz. Seus projetos tecnológicos não foram bem sucedidos mas suas observações sobre a geologia das montanhas o levaram a propor a hipótese de que a terra foi formada no passado por lava derretida.

Além de seus trabalhos em cálculo Leibniz obteve outros resultados importantes em matemática. Ele trabalhou com sistemas aritméticos binários e com o conceito de determinantes, usado na solução de sistemas de equações lineares. Sobre a mecânica ele questionou o sistema de Descartes e examinou os conceitos de energia potencial e cinética e de momento.

Leibniz era um homem atuante, que buscava difundir as idéias mais modernas e interagir com os demais pensadores de seu tempo. Ele esteve envolvido na formação de academias e sociedades científicas e não seria exagero dizer que ele esteve em contato com a maioria dos matemáticos da época. Um exemplo foi sua correspondência com Grandi, iniciada em 1703, onde se discutiu o paradoxo obtido ao se atribuir o valor \(x=1\) na expansão em série para
$$\frac{1}{a+x}= 1-x+x^2-x^3+⋯.$$

Na filosofia ele buscou aperfeiçoar seu sistema de redução do raciocínio a uma álgebra do pensamento. Ele publicou seu Meditationes de Cognitione, Veritate et Ideis (Reflexões sobre o Conhecimento, Verdade e Idéias) visando aperfeiçoar sua teoria do conhecimento. Em 1686 Leibniz escreveu Discours de Métaphysique e, em 1710, Théodicée onde tratava da questão da existência do mal em um mundo criado por Deus. Neste tratado ele afirmava que o mundo necessariamente teria que ser imperfeito, caso contrário não seria distinto de Deus. No entanto, deveria ser o mais perfeito possível sem, no entanto, violar a lei natural. A eliminação dos desastres naturais, segundo ele, envolveria alterações tão dramáticas na lei natural que resultariam em um mundo ainda pior. Em 1714 Leibniz escreveu Monadologia sintetizando sua obra filosófica.

Leibniz era um homem de interesse e atuação universais, um livre-pensador incansável. Profundamente dedicado ao entendimento mútuo entre pessoas, escolas e correntes de pensamento, ele deliberadamente optou por ignorar a fragmentação entre as disciplinas que, já naquela época, se instalava no ambiente das universidades. Ele julgava que uma eventual deficiência em sua formação em determinada disciplina não deveria ser um empecilho para que contríbuisse naquela área. De certa forma ele se mostrava hostil para com a instituição universitária porque julgava que sua estrutura rígida dificultava a interação entre disciplinas, essencial para o avanço do conhecimento. É interessante notar como um homem de interesse universalista, dedicado ao processo de compreensão mútua entre escolas de pensamento diversas, tenha se envolvido em uma disputa tão áspera e duradoura com outro grande gênio, como ocorreu com Newton sobre a autoria do cálculo.

A Polêmica Newton versus Leibniz

Durante as viagens que fez pela Europa Leibniz estabeleceu contato com diversos matemáticos importantes da época. Ele estudou matemática e física com Christian Huygens em Paris, em 1672 e esteve com Hooke e Boyle em Londres no ano de 1673. Na mesma ocasião ele adquiriu diversos livros sobre matemática, inclusive os trabalhos de Barrow, com quem manteve extensa correspondência. Retornando para Paris Leibniz realizou importantes contribuições na área do cálculo, julgando que seu trabalho fosse muito diferente do de Newton. Newton tratava as variáveis como funções do tempo enquanto Leibniz considerava suas variáveis \(x\) e \(y\) como valores assumidos sobre sequências de valores infinitamente próximos. Ele introduziu a noção de \(dx\) e \(dy\) como diferenças entre valores próximos dentro destas sequências. Leibniz sabia que podia calcular a inclinação da tangente como \(dy/dx\) mas não usou este fato como definição da reta tangente.

Para Newton a integração consistia de se encontrar fluentes para um dado fluxo e, desta forma, a complementariedade da diferenciação e da integração como operações inversas estava implícita. Leibniz usava a integração como uma soma, de forma muito similar àquela usada por Cavalieri e, mais recentemente, por Riemann. Ele também se sentia à vontade com o uso dos infinitesimais \(dx\) e \(dy,\) enquanto Newton usava a notação \(\dot x, \dot y\) que representavam velocidades finitas. Nem Leibniz nem Newton pensavam em termos de funções e sim em termos dos gráficos envolvidos. Para Newton o cálculo era formado por operações geométricas enquanto Leibniz fez maior progresso na direção da análise.

Leibniz tinha consciência de que a definição e adoção de uma boa notação era de fundamental importância e se dedicou com esforço a esta questão. Por outro lado seu rival, Newton, parecia escrever mais para si mesmo do que para um público geral e, como consequência, tendia a usar uma notação que variava a cada momento. A notação de Leibniz, \(d/dx\) enfatizava o aspecto de operador da derivação, o que se revelou muito importante para o progresso posterior da disciplina. Até o ano de 1675 Leibniz já tinha estabelecido a notação que hoje nos permite escrever coisas como
$$\int xdx = \frac{x^2}{2},$$
com notação usada nos dias de hoje. Seus resultados em cálculo integral foram publicados em 1684 e 1686 sob o nome de Calculus Summatorius. O nome moderno, cálculo integral, só apareceu como sugestão Jacob Bernoulli, em 1690.

Nesta época 1676 Newton escreveu uma carta para Leibniz, enviada por meio de Oldenburg. Nesta carta, que demorou para chegar ao destino, Newton apresentava uma lista de suas conclusões sem dar, no entanto, uma descrição de seus métodos. Leibniz respondeu imediatamente sem perceber que houvera demora tão grande no recebimento daquela carta. Por sua vez Newton acreditou que Leibniz tivera seis semanas para elaborar sua resposta, aperfeiçoando suas considerações sobre o cálculo com base em sua própria carta. Percebendo o descontentamento do colega Leibniz compreendeu que deveria publicar sem atraso uma descrição completa de seus próprios métodos. Uma segunda carta foi enviada a Leibniz em outubro de 1676 onde Newton, ainda que mantendo o tom cortês, sugeria que seus métodos e operações haviam sido plagiados. Leibniz respondeu dando mais detalhes sobre os fundamentos de seu cálculo diferencial e integral, incluindo a regra para a derivação de uma função composta.

Embora Newton reclamasse que Leibniz não havia resolvido nenhum novo problema é inegável que seus métodos e formalismo foram vitais para o desenvolvimento posterior do cálculo. Cabe lembrar que Leibniz nunca considerou a derivada como um limite, um conceito só desenvolvido mais tarde com o trabalho de d’Alembert.

Em 1684 Leibniz publicou em detalhes seu método sobre o cálculo diferencial em um jornal denominado Nova Methodus pro Maximis et Minimis, itemque Tangentibus… in Acta Eruditorum. Neste artigo ele usa a notação hoje familiar de \(df\) para a diferencial de uma função, as regras para a derivação de potências, produtos e quocientes de funções. No entanto nem todas as demonstrações estavam presentes. Em 1686 Leibniz publicou um novo artigo sobre o cálculo integral.

O livro de Newton, Principia, apareceu no ano seguinte. O método dos fluxos foi desenvolvido em 1671 mas permaneceu não publicado até 1736, com a tradução para o inglês de John Colson. Este atraso na publicação, em grande parte motivado pela relutância de Newton em aceitar a exposição e críticas dos colegas matemáticos foi o responsável pelo conflito e disputas com Leibniz.

Grande parte das atividades científicas de Leibniz em seus últimos anos de vida estava relacionada com esta disputa sobre a invenção do cálculo. Em 1711 um artigo na Transactions of the Royal Society of London o acusava de plágio. Este artigo, bem como os demais ataques, partiam de partidários de Newton e não dele próprio, diretamente. Em sua defesa Leibniz argumentou que não tivera contato com o cálculo dos fluxos até o conhecimento da obra de Wallis. Em resposta Keill afirmou que a carta enviada por Newton através de Oldenburg continha indicações claras de seu método. Em carta para a Royal Society Leibniz pediu uma retratação, o que motivou a formação de um comitê para julgar a questão. O comitê, formado pelo próprio Newton, julgou a questão sem dar a Leibniz o direito de defesa emitindo parecer favorável a Newton. O relatório final, escrito por Newton, atribuía a ele a autoria do cálculo. Leibniz publicou um panfleto anônimo, intitulado Charta Volans, onde narrava sua versão dos fatos e se utilizava, em sua defesa, de um erro de Newton sobre derivadas de segunda ordem e ordens superiores. Mais uma vez os partidários de Newton vieram a público em sua defesa mas Leibniz se recusou a levar adiante o debate. Ao receber correspondência de Newton, Leibniz respondeu com uma descrição detalhada de sua descoberta do cálculo diferencial.

Entre seus correspondentes Leibniz manteve com Samuel Clarke, um defensor de Newton, um debate sobre os conceitos newtonianos sobre espaço e tempo, ação à distância e atração gravitacional através do vácuo. Parte desta discussão afetou, mais tarde, o pensamento de Ernst Mach e, por sua vez, Albert Einstein, levando à construção da nova teoria mecânica e da atração gravitacional exposta pela Teoria da Relatividade. A defesa apaixonada da posição de Newton e a recusa em adotar a terminologia e notação de Leibniz fizeram com que os progressos do cálculo fossem retardados na Inglaterra, enquanto na Europa continental os seguidores de Leibniz promoviam um rápido avanço da ciência.

Desenvolvimentos Posteriores

George Berkeley

Nem Newton, nem Leibniz, nem seus seguidores imediatos foram capazes de estabelecer uma base rigorosa para o cálculo. Não estava claro como a soma de elementos muito pequenos, tais como \(f(x) dx\) deveria resultar em uma quantidade finita. Na mecânica, se \(\nabla x\) é a variação espacial ocorrida em um tempo \(\nabla t\), ambos infinitesimais, que sentido teria a velocidade instantânea, entendida como um quociente, \(v = \frac{\nabla x}{\nabla t}\)? A fundamentação rigorosa do cálculo teria ainda que aguardar por muitos anos. A ausência de um formalismo algébrico consistente e o apego aos métodos geométricos herdados dos gregos representou uma dificuldade para este avanço. Na visão de Leibniz a preocupação excessiva com o rigor ausente não deveria impedir o uso e os progressos da disciplina. Como sabemos hoje o conceito que faltava era exatamente o conceito de limite, só estabelecido rigorosamente no século XIX.

(6) O problema da braquistócrona consiste em encontrar a curva percorrida por uma partícula que se move sujeita a um campo gravitacional constante de modo que gaste, para isto, o menor tempo possível. Este problema impulsionou a criação do cálculo das variações.

Um grande esforço foi feito por diversos pensadores quando o bispo George Berkeley (1685-1753) divulgou em 1734 um panfleto intitulado The Analyst atacando a ausência de rigor que se verificava no cálculo da época. Novos progressos foram atingidos pelos seguidores de Newton e Leibniz, em parte na tentativa de responder a estes ataques. Entre eles estavam Jacob e Johann Bernoulli, discípulos de Leibniz. Nove membros da família Bernoulli se destacaram na matemática ou na física, sendo que os principais foram os irmãos Jakob (1654-1705) e Johann (1667-1748) e o filho deste, Daniel (1700-1782). A teoria das probabilidades, os princípios do cálculo e a integração das equações diferenciais foram algumas das contribuições dos Bernoulli.

Jakob (Jacques) Bernoulli estudou teologia mas desde cedo, apesar da oposição de seu pai, mostrou vocação para a matemática. Suas principais contribuições foram a descoberta, em conjunto com seu irmão Johann, de que a série harmônica é divergente, a solução do problema da braquistócrona(6), a demonstração do teorema do binômio para expoentes inteiros e positivos e a introdução dos polinômios e dos números de Bernoulli, de grande importância para demonstrações de diversos teoremas da álgebra e para o estabelecimento de fórmulas do cálculo. Ele também contribuiu para a geometria diferencial com seu estudo sobre geodésicas de uma superfície.

Johann (Jean) Bernoulli iniciou os estudos matemáticos com o irmão Jakob. Formou em medicina mas logo dedicou-se ao estudo do cálculo integral e diferencial. Estudou o movimento pendular e estabeleceu suas características e formulou conceitos matemáticos referentes à ótica. Durante um período que passou em Paris ele foi professor do marquês de L’Hospital (1661-1704) ensinando a ele a nova disciplina criada por Leibniz. Em seguida assinou um documento se comprometendo a enviar ao marquês suas descobertas matemáticas, em troca de um salário regular, para que ele as usasse como quisesse. Como resultado o marquês publicou como sua uma das mais importantes contribuições de Bernoulli, desenvolvida em 1694 e mais tarde conhecida como regra de L’ Hospital sobre indeterminações. A regra de Bernoulli afirma que, se \(f(x)\) e \(g(x)\) são diferenciáveis em \(x_0\) e satisfazem as condições \(f(x_0)=0\) e \(g(x0)=0\) então
$$ \lim_{x\to a} \frac{f(x)}{g(x)} = \lim_{x\to a} \frac{f'(x)}{g'(x)}$$
desde que exista este último limite. Embora não sendo o autor intelectual dos conceitos expostos L’ Hospital realizou um bom trabalho didático e de compilação de forma que seu livro, Analyse des infiniment petits, publicado em Paris, 1696, foi amplamente utilizado até o final do século XVIII.

O segundo filho de Johann, Daniel Bernoulli, estudou lógica, filosofia e medicina, assumindo a posição de professor de mecânica, física e medicina. Considerado por alguns historiadores como o fundador da física matemática ele formulou o princípio da conservação de áreas, que complementa o princípio da conservação de massa de Newton e dedicou-se a diversos campos do conhecimento científico, como a fisiologia, a astronomia, o magnetismo, as correntes oceânicas e as marés. Em sua obra mais importante ele analisa as propriedades dos fluidos, formula a teoria cinética dos gases e expõe o teorema de Bernoulli, segundo o qual a pressão de um fluido diminui quando sua velocidade aumenta.

Historicamente sempre houve a necessidade de se representar funções, pelo menos como uma aproximação, por meio de polinômios. Como vimos foi desta forma que Newton e outros realizaram as primeiras operações de derivação e integração. Além disto existe a necessidade prática de se calcular o valor de diversas funções para uso em aplicações. Tábuas de valores para as funções logaritmo e trigonométricas eram necessárias para o uso na astronomia, cartografia e navegação, entre outros. Uma forma simples para a obtenção de tais tábuas era a de interpolar valores, ou seja, conhecidos os valores de uma função em dois pontos próximos os valores intermediários podiam ser obtidos por interpolação linear, supondo que a função fosse linear entre estes valores. Matematicamente, se conhecemos \(f(a)\) e \(f(b)\) então\(f(x)\) pode ser aproximada pela reta
$$y(x) = f(a) + \frac{f(b)-f(a)}{b-a}(x-a),$$

pelo menos para pontos interiores ao intervalo \([a,b]\) e esta aproximação será tanto melhor se a e b estiverem próximos. Observe que se \(b\) é tomado arbitrariamente próximo de \(a\) então temos a equação da tangente à curva de f(x) no ponto \(x=a:\)
$$ y(x) = f(a) + \frac{df}{dx}|_{x=a}(x-a).$$

Tangente e secante

Logo se tornou claro que aproximações mais refinadas poderiam ser obtidas aproximando-se a função por polinômios de ordem superior. Em 1624 um matemático chamado Briggs já utilizava esta abordagem. Uma generalização foi obtida por Newton em 1676 e, de modo independente, por James Gregory em 1670. Estas expansões, além de permitir o cálculo de valores para funções com precisão arbitrária também servia na avaliação de integrais e cálculos de áreas, reduzindo a operação de integrar uma função genérica à integração de \(x^n\) através da fórmula de Fermat,
$$\int x^ndx = \frac{x^{n+1}}{n+1}.$$

No esforço de sistematizar e estabelecer critérios de rigor para o cálculo, grandes progressos forma conseguidos por matemáticos do século XVIII, quando surgiram as teorias das Equações Diferenciais, das Séries Infinitas, da Geometria Diferencial, Cálculo das Variações e tópicos de análise. Neste período viveram matemáticos importantes como Taylor, Euler, d’Alembert, Lagrange e Laplace.

Um resultado já obtido por Gregory e Leibniz, mas só publicado em 1715 por Brook Taylor (1685-1731) estabelece formalmente a expansão de funções diferenciáveis em séries de potências. Matemático inglês, Taylor escreveu o primeiro tratado sobre o cálculo das diferenças finitas, estudou tópicos diversos em matemática, sobre a trajetória da luz num meio homogêneo, a freqüência das vibrações e oscilação transversal de uma corda. A fórmula de Taylor é a seguinte: uma função analítica \(f\) pode ser aproximada em uma vizinhança do ponto \(x=a\) pelo polinômio de grau \(N\) como
$$f(x)=\sum_{n=0}^N \frac{1}{n!}f^n(a)(x-a),$$

onde definimos
$$ f^{(n)}(a) = \frac{d^n f}{dx^n}\Biggl\arrowvert _{x=a},\;\;f^{(0)}(a)=f(a),\;\;0!=1.$$

Por analogia com a teoria das funções de variáveis complexas dizemos que uma função é analítica quando possui derivadas de todas as ordens e estas derivadas são contínuas. Portanto, uma função é analítica se, e somente se, possui expansão de Taylor. Um caso particular desta expansão foi publicado em 1742 por Colin MacLaurin (1698-1746), onde se fazia \(a=0\). Taylor, como seus contemporâneos, não trabalhava com o conceito de limite. Ele simplesmente fazia os desenvolvimentos em termos de uma quantidade suposta infinitesimal, digamos \(\nabla h\), e ao final da operação tomava \(\nabla h=0\). Esta falta de rigor dos primeiros tempos do cálculo, em flagrante contraste com rigor atingido pelos geômetras gregos, alimentaram a oposição daqueles que se opunham ao cálculo.

Por muitos anos os matemáticos trabalharam com as expansões em séries de potência até uma ordem \(N\), como se as funções pudessem ser fielmente representadas por polinômios. Diferenciações e integrações eram obtidas operando-se no polinômio, termo a termo. Embora este procedimento estivesse correto algumas vezes também dava origem a resultados incorretos e até absurdos. O que estava faltando eram a noção de convergência de uma série e os testes para estabelecer esta convergência. A própria noção de limite não estava estabelecida com clareza.

Leonhard Euler

Um passo importante para a rigorização do cálculo foi obtido por Euler. Leonhard Euler (Suiça: 1707-1783) foi um matemático de interesses variados e que produziu uma extensa obra científica. Como estudante Euler mostrou precocidade, despertando a atenção dos principais matemáticos de sua época, como Jean Bernoulli e seus filhos. Ele produziu trabalhos sobre Mecânica, Astronomia, ótica, Cartografia, Acústica, entre outros tópicos da Física. Euler foi um dos primeiros cientistas a defender a teoria ondulatória da luz, em oposição à teoria corpuscular de Newton, amplamente adotada na época. Na matemática ele expôs os fundamentos de sua contribuição na obra Introductio in analysim infinitorum (Introdução à análise dos infinitos) publicada em 1748. Euler trabalhou sobre os fundamentos da geometria analítica e do cálculo, desenvolveu a teoria das funções trigonométrica e logaritmica e simplificou as operações relacionadas à análise matemática. Além disto trabalhou na teoria dos números e criou o Cálculo Variacional, o estabelecimento de pontos críticos de funcionais, ou funções que dependem de outras funções, hoje uma das ferramentas básicas da física, particularmente na mecânica clássica e quântica e na teoria das partículas e campos. Ele foi o fundador da Mecânica Analítica, um aperfeiçoamento formal da mecânica newtoniana com poder de cálculo bastante superior aos métodos usados por Newton e estabeleceu os fundamentos da Geometria Diferencial, que consiste no estudo de curvas e superfícies por meio dos métodos do cálculo, generalizado mais tarde por Riemann em sua geometria de curvas e hiper-superfícies de qualquer dimensão.

Euler escreveu inúmeros livros e artigos científicos, mesmo após ter perdido a visão aos sessenta anos. Ele foi o responsável pela adoção de diversos símbolos hoje consagrados na literatura da matemática, tais como a letra grega \(\Sigma\) para indicar uma soma e a letra \(e\) para designar a base dos logaritmos naturais ou neperianos, \(e^x\) para a função exponencial. A famosa fórmula de Euler, \(e^{i\theta} =cos \theta + i \mbox{sen} \theta\) foi obtida quando se buscava uma interpretação coerente para o logaritmo de números negativos. Esta expressão já era conhecida por Jean Bernoulli e outros mas só foi expressa claramente por Euler. Fazendo \(\theta=\pi\) na expressão acima temos que \(e^{i\pi}=-1\) e, portanto, \(ln(-1) = \pi i,\), um número imaginário puro.

Em meados do século XVIII uma grande renovação intelectual teve início na França. Juntamente com Voltaire, Rousseau e Diderot, Jean Le Rond d’Alembert (França: 1717-1783) empreendeu a edição da célebre Encyclopédie que tanta ressonância teve naquele século e assentou a base cultural do movimento que culminou na revolução francesa de 1789. Recém nascido, d’Alembert foi abandonado por pais de origem aristocrática nos degraus da igreja de St. Jean Baptiste Le Ronde, de onde tirou seu nome, tendo sido recolhido por pessoas humildes que o criaram. Mais tarde, já um matemático de renome, ele haveria de recusar a reaproximação da mãe biológica, dando preferência a ser conhecido como filho de seus humildes pais adotivos.

d’Alembert estudou Direito e Medicina mas abandonou as estas atividades para se dedicar exclusivamente à matemática. Em 1741 publicou sua obra Traité de dynamique onde estabelece que a lei de ação e reação postulada por Isaac Newton também se aplica aos corpos sólidos rígidos, estudo de profunda relevância no projeto e construção de estruturas construídas para suportar grandes cargas. Ele também fez contribuições para a mecânica de fluidos, astronomia e ótica. No cálculo ele se opunha ao uso que Euler fazia das diferenciais de uma função, supondo que são quantidades nulas embora qualitativamente diferentes de zero. Em seu artigo para a Encyclopédie sob o verbete diferencial ele escreveu que “a diferenciação de equações consiste simplesmente em achar os limites da razão de diferenças finitas de duas variáveis na equação”. Este ponto de vista afasta a noção da diferencial como grandezas infinitesimalmente pequenas. A formulação de limites de d’Alembert não foi exposta sob forma clara e não foi aceita por seus contemporâneos que continuaram a usar a linguagem de Leibniz e Euler. Esta situação durou até o século XIX.

DAlembert, Laplace, Lagrange e Monge

O matemático e físico Joseph Louis de Lagrange (Itália: 1736-1813) teve importância decisiva para o desenvolvimento da teoria dos números, do cálculo e da mecânica celeste. Ele estudou o movimento da Lua e publicou vários trabalhos contendo notas complementares à gravitação newtoniana, sobre a teoria dos números, probabilidade e equações diferenciais e análise de problemas algébricos, precursores da teoria de grupos, desenvolvida mais tarde por évariste Galois.

Lagrange escreveu bem menos que Euler mas manteve sempre em seus escritos grande rigor e cuidados, o que lhe valeu a fama de maior matemático de seu século. Em sua obra principal, Mécanique Analytique (1788) Lagrange propôs um formalismo aperfeiçoado para o estudo da mecânica analítica, o que estabeleceu esta disciplina em definitivo como um ramo da análise matemática. Em 1797 ele publicou Théorie des Fonctions Analytiques onde procurou as bases algébricas do cálculo, sem a necessidade da consideração de quantidades infinitesimais. Partindo do desenvolvimento em séries de potências para uma função, estabelecido por Taylor, ele apresentava suas derivadas em termos dos coeficientes da expansão. Sua obra representou a fundação do maior rigor que seria alcançado no século XIX.

O físico, matemático e astrônomo francês, Pierre Simon Laplace (França: 1749-1827) pesquisou eletromagnetismo, probabilidade e mecânica celeste. De origem modesta, ele se destacou quando estudante e foi recomendado por d’Alembert para o cargo de professor da Escola Militar de Paris, em 1769. Ele chegou a colaborar com Lavoisier no estudo dos processos químicos em biologia, mostrando que a respiração orgânica é uma forma de combustão produzida pela oxidação de substâncias orgânicas. Laplace realizou uma compilação das teorias astronômicas de Isaac Newton, Edmundo Halley e outros cientistas cujas obras encontravam-se dispersas e, em seguida, realizou cálculos cuidadosos sobre os efeitos da gravitação de cada planeta sobre os demais corpos do sistema solar, descobrindo que as órbitas ideais propostas por Newton apresentavam desvios. Em seus estudos associados à atração gravitacional Laplace estudou a equação diferencial
$$ \frac{\partial^2 \phi}{\partial x^2} + \frac{\partial^2 \phi}{\partial y^2} + \frac{\partial^2 \phi}{\partial z^2} =0,$$

que deveria ser satisfeita para potencial gravitacional \(\phi,\) no vácuo. A mesma equação pode ser escrita, em notação moderna, \(\nabla ^2 \phi =0\), onde \(\nabla\) é o operador vetorial \((\partial_x, \partial_y, \partial_z )\). No entanto esta equação apareceu pela primeira vez em um artigo de Euler sobre hidrodinâmica, em 1752.

Em Exposition du Système du Monde (1796) Laplace propôs a teoria da formação nebular para o sistema solar que leva seu nome. Seus trabalhos sobre a teoria da probabilidade tornaram-se amplamente conhecidas e respeitados. Laplace estudou a transformação de uma função em outra, hoje denominada transformada de Laplace, \(\mathcal L \left[f(t)\right]\) definida como a integral imprópria
$$ F(s) = \mathcal L \left[ f(t)\right] = \int_0 ^\infty e^{-st}f(t)dt, $$

mais tarde utilizadas pelo engenheiro elétrico Oliver Heaviside (1850-1925) para a construção de um método para a solução de equações diferenciais particularmente importante no estudo de sistemas elétricos e mecânicos envolvendo oscilações, amortecimentos e fenômenos correlatos.

O trabalho desenvolvido por mais de quarenta anos por Adrien Marie Legendre (França: 1752-1833) no setor das integrais elípticas forneceu instrumentos analíticos básicos para a física matemática. Ainda jovem Legendre foi nomeado professor de matemática da Escola Militar. Ele escreveu quatro dissertações sobre a atração dos esferóides. Na primeira, de 1783, estudou as funções que receberam seu nome e são soluções para a equação diferencial
$$\left(1-x^2 \right) y” – 2xy’ + l(l+1)y =0,$$

que surgem frequentemente em problemas que envolvem simetria esférica, tais como o potencial elétrico em torno de distribuições esféricas de cargas e a distribuição eletrônica no átomo de hidrogênio. As soluções podem ser obtidas pelo método de séries de potências fazendo \(y=\sum_0 ^\infty a_n x\). Para o caso de \(l\) inteiro não negativo a série infinita é truncada para um valor de \(n\) e as soluções são os polinômios de Legendre:
$$P_0(x) = a_0,\,P_1(x) = a_1 x,\, P_2(x) = a_0,\,\left(1-3x^2 \right) a_0,\, P_3(x) = \left(x-\frac{5}{3}x^3 \right) a_1,\,\ldots.$$

 

(7) Em 1896 foi mostrado que \(\pi(n) \to n\ln n\).

Legendre adquiriu notoriedade por obra éléments de géométrie (1794), escrita, nas palavras do autor, “para satisfazer o espírito” onde ele procurava manter um alto nível de rigor formal. Legendre desenvolveu o método dos mínimos quadrados e, em 1798, publicou o primeiro livro exclusivamente à teoria dos números onde contribuiu para assentar as bases de um dos mais famosos problemas da aritmética, o da distribuição dos números primos. Já era conhecido, desde Euclides, que os números primos são infinitos. Embora seja claro que a densidade dos primos diminua para inteiros crescentes muitos estudiosos procuraram a regra de descrição desta densidade \(\pi(n)\), que expressa o número de primos menores que \(n\). Legendre fez conjecturas aproximadas para a solução desde problema(7).

Os trabalhos de Legendre, apesar do impulso dado ao crescimento da matemática, foram superados rapidamente pelos esforços de Carl Friedrich Gauss, em aritmética, e Niels Abel e Karl Jacobi, nas funções elípticas. Ele não mostrava grande simpatia para com Gauss, mas recebeu com entusiasmo as contribuições de Abel e Jacobi. Numa demonstração de altruísmo Legendre divulgou estes trabalhos com prazer, embora elas tornassem obsoletos os esforços de toda sua vida.

Vimos que o estabelecimento das séries de potência para a representação de funções sempre representou um papel importante no estabelecimento do cálculo, tanto para a operação de derivação como para a integração. Mas um novo formalismo para a descrição de funções como séries infinitas estava ainda por ser encontrado por Jean Baptiste Joseph Fourier (França: 1768-1830).

Fourier era filho de um alfaiate e mostrou cedo ter grande talento para a matemática. Ele participou ativamente na revolução francesa de 1789. Em 1795 se tornou professor da recém-criada école Normale e, em seguida, da école Polytechnique. Aproveitando-se de suas viagens ao Egito, motivadas pelo trabalho em política, Fourier fez estudos sobre a civilização antiga daquele povo e deixou contribuições notáveis no campo da egiptologia.

Fourier estava interessado em aplicar o formalismo matemático na solução de problemas físicos. Em sua obra mais importante, Théorie analytique de la chaleur (1822), ele mostrou que a condução do calor em corpos sólidos pode ser expressa por meio de séries trigonométricas infinitas. As séries trigonométricas propostas por Fourier se baseiam na ortogonalidade das funções seno e cosseno:
$$\frac{1}{l} \int_{-l}^{l} \cos \frac{n \pi x}{l} \cos \frac{m \pi x}{l} = \delta_{mn};\;\; \frac{1}{l} \int_{-l}^{l}\mbox{sen} \frac{n\pi x}{l} \mbox{sen} \frac{m\pi x}{l} =\delta_{mn}
$$
$$\int_{-l}^{l} \cos \frac{n\pi x}{l} \mbox{sen} \frac{m\pi x}{l} = 0.$$
onde \(\delta_{mn}\) é o símbolo de Kronecker,
$$\delta_{mn}=\left\{ \begin{array}{ll} 1, \mbox{ se } m = n \\
0, \mbox{ se } m \ne n
\end{array} \right.$$

(8) Basta que \(f\) e \(f′\) sejam seccionalmente contínuas, ou seja, contínuas em subintervalos da região considerada.

É possível então escrever uma expansão em séries trigonométricas para uma função contínua com derivada contínua(8) e periódica com período \(2l\) da seguinte forma:
$$f(x) = \frac{a_0}{2}+\sum_{n=1}^\infty\left(a_n\cos\frac{n\pi x}{l} + b_n\mbox{sen}\frac{n\pi x}{l} \right),$$
onde os coeficientes \(a_n\) e \(b_n\) são dados por
$$a_n=\frac{1}{l}\int_{-l}^{l}f(x)\cos\frac{n\pi x}{l}dx,\,\,b_n=\frac{1}{l}\int_{-l}^{l}f(x)\mbox{sen}\frac{n\pi x}{l}dx,$$

Fourier

Em uma apresentação para a Academia de Ciências de Paris, em 1807, Fourier descreveu seu trabalho afirmando que qualquer função poderia ser representada por uma série desta forma. Lagrange, presente à reunião, ficou surpreso e negou em termos definitivos que tal coisa pudesse ser correta. Embora tenha exagerado na generalidade do método, o trabalho de Fourier motivou uma grande quantidade de pesquisas em andamento até os dias de hoje, sobre as condições impostas à função para que seja representável desta forma e os critérios de convergência. As séries de Fourier estão geralmente associadas ao tratamento das equações diferenciais parciais e se aplicam a um grande número de problemas físicos e matemáticos, inclusive no tratamento de sinais, na compactação de informações e na base do formalismo matemático da mecânica quântica. Uma generalização deste conceito resulta na transformada de Fourier, que pode ser obtida heuristicamente pela tomada do limite \(l \to \infty.\)

Um trabalho importante para o estabelecimento do rigor no cálculo foi realizado pelo tcheco Bernhard Bolzano (1781-1848), um sacerdote católico que se dedicou ao estudo da filosofia e da matemática. Bolzano era um ativista em favor das reformas que buscavam a diminuição das desigualdades sociais, da condenação do militarismo e da guerra e pela liberdade de pensamento. Na matemática ele definiu, em 1817, o conceito de continuidade de uma função nos moldes em que hoje o conhecemos e criou o critério de convergência hoje chamado de “critério de Cauchy”. Ele também demonstrou o teorema do valor intermediário e o teorema de Bolzano-Weierstrass. Um de seus objetivos era o de estabelecer uma base formal e analítica para os métodos do cálculo, eliminando das demonstrações a intuição geométrica. Seus escritos, às vezes considerados pouco claros e excessivamente voltados para os fundamentos, receberam pouca divulgação e só foram devidamente apreciados na década de 1870.

Mais um dos responsáveis pelo lançamento das bases rigorosas do cálculo foi Augustin Louis Cauchy que viveu na França de 1789 a 1857. Cauchy foi considerado um dos matemáticos mais importantes dos tempos modernos. Formado em engenharia, publicou grande quantidade de artigos matemáticos e solucionou um problema proposto por Lagrange que estabelece uma relação entre o número de lados, vértices e faces de um poliedro convexo. Em 1814 publicou um trabalho sobre integrais definidas, que serviria de base para o desenvolvimento da teoria das funções complexas e, no ano seguinte, estudou os grupos de permutação, impulsionando a moderna teoria dos grupos.

Cauchy realizou trabalhos sobre mecânica, propagação das ondas e hidrodinâmica. Em 1822 lançou as bases da teoria matemática da elasticidade. Suas principais contribuições para a matemática, sempre pautadas pelo rigor e clareza dos métodos empregados, estão expostas em três grandes tratados: Cours d’analyse de l’école Royale Polytechnique (1821), Le Calcul infinitésimal (1832) e Leçons sur les applications du calcul infinitésimal à la géométrie (1826-1828).

Quatro anos após o surgimento do trabalho de Bolzano, que Cauchy desconhecia, ele publicou seu Cours d’analyse onde aparecem as definições de limite, continuidade de funções e o chamado critério de convergência, já desenvolvido por Bolzano e que leva seu nome. Ele também fez contribuições importantes para a álgebra linear e teoria dos determinantes. O próprio conceito de determinante, que recebeu de Cauchy esta designação, já havia sido empregado por Gauss mas só foi definitivamente incorporado à matemática graças a Cauchy.

A primeira demonstração correta da convergência das séries de Fourier e as condições sobre as funções para que esta convergência ocorra foi obtida em 1829 por Peter Gustav Lejeune Dirichlet (1805-1859). A definição de função usualmente apresentada nos cursos de cálculo modernos é basicamente a mesma apresentada por Dirichlet em 1837. A seguinte ““função de Dirichlet” foi proposta por ele para mostrar a generalidade do conceito de função:
$$\phi(x)=\left\{ \begin{array}{ll} a, & \mbox{ se } x \mbox{ é racional }\\
b, & \mbox{ se } x \mbox{ é irracional }
\end{array}\right.$$

Riemann

Esta função impulsionou Riemann a realizar estudos mais aprofundados sobre a teoria da integração. Apesar de ser mais conhecido pelas suas contribuições em análise e equações diferenciais Dirichlet foi também um grande pesquisador da teoria dos números.

(9) Uma função é analítica em uma região \(R\) se ela é derivável em todos os pontos de \(R\).

George Friedrich Bernhard Riemann (Alemanha: 1826-1866) influenciou profundamente a geometria e a análise. Embora sendo um matemático de idéias profundas e inovadoras Riemann era uma pessoa tímida e não gostava de exposição. Como estudante em Göttingen e Berlim ele se interessou pela teoria dos números primos, as funções elípticas e a geometria, que relacionou com as teorias mais modernas da física de sua época. Em 1851 doutorou-se com uma tese sobre os fundamentos de uma teoria geral das funções, estabelecendo relações entre os números complexos e a geometria. Nesta tese aparece uma sistematização das condições, já conhecidas no tempo de Euler, que uma função de uma variável complexa \(f(z)=u(x, y)+iv(x, y)\) deve satisfazer para ser uma função analítica(9), as chamadas equações de Cauchy-Riemann:
$$ \frac{\partial u(x,y)}{\partial x} = \frac{\partial v(x,y)}{\partial y}, \;\;\;\;
\frac{\partial u(x,y)}{\partial y} = -\frac{\partial v(x,y)}{\partial x}.
$$
Em notação mais compacta podemos escrever \(u_x=v_y,\,\,u_y=−v_x\).

Após um levantamento feito sobre o desenvolvimento histórico das séries trigonométricas, de d’Alembert a Dirichlet, Riemann percebeu que seria necessário estabelecer uma interpretação inequívoca da integração de uma função, desenvolvendo a integral de Riemann, e aplicando-a ao estudo das séries trigonométricas. A integral de Riemann pode ser definida da seguinte forma: se \(f\) é uma função real limitada, definida no intervalo \([a, b]\), construímos partições deste intervalo, \(a=\xi_0 \lt \xi_1 \lt \ldots \lt \xi_n = b\). Para cada partição definimos as somas
$$ S=\sum+{i=1}^n\left(\xi_i – \xi_{i-1} \right) M_i;\,\, s = \sum+{i=1}^n\left(\xi_i – \xi_{i-1} \right) m_i)$$

onde \(M_i\) e \(m_i\) são, respectivamente, o maior e o menor valor assumidos por \(f\) no subintervalo \([\epsilon_{i-1}, \epsilon_{i}]\). A integral superior \(\) e a integral inferior de Riemann são definidas assim:
$$ \overline{\int}_a ^b f(x)dx = \mbox{ inf } S, \;\; \underline{\int}_a ^b f(x)dx = \mbox{sup } s,$$
onde inf e sup são respectivamente o ínfimo e o supremo, consideradas todas as possíveis partições do intervalo. Se os dois valores são iguais então se diz que a função é integrável à Riemann e sua integral é denotada simplesmente por \(\int_a ^b f(x)dx\).

Figura 4: Integral de Riemann

Em 1854 o matemático, ao preparar uma dissertação para ingressar como professor assistente em Göttingen, Riemann abandonou os postulados da geometria euclidiana e formulou uma geometria mais geral, que englobava as geometrias de Nikolai Lobatchevski e János Bolyai, que ele desconhecia. Sua conferência, intitulada Sobre as hipóteses que estão nos fundamentos da geometria, se tornou célebre pela profundidade e generalidade dos conceitos apresentados. Nela ele não apresentava nenhum exemplo específico de seus conceitos e propunha o estudo de uma geometria como o estudo de variedades com qualquer número de dimensões em qualquer tipo de espaço, não necessariamente formado por conjuntos de pontos ou retas. A distância entre dois pontos infinitesimalmente próximos, na geometria euclidiana é dada por
$$ds^2 = dx^2 + dy^2 + dz^2,$$
o que é apenas uma dupla aplicação do teorema de Pitágoras. Riemann generalizou este conceito para tratar espaços onde estas distâncias são dadas por
$$
ds^2 = \left[dx\;\;dy\;\;dz \right]
\left[ \begin{array}{lll} g_{11} & g_{12} & g_{13} \\
g_{21} & g_{21} & g_{23} \\
g_{31} & g_{32} & g_{33} \\
\end{array} \right]
\left[ \begin{array}{l} dx \\ dy \\ dz \end{array} \right]
$$
no caso de três dimensões. Generalizando para um espaço de \(n\) dimensões, e usando uma notação mais compacta
$$ ds^2 = \sum_{i=1}^n \sum_{j=1}^n g_{ij}dx_i dx_j$$

onde denotamos \(x=x_1\), \(y=x_2,\), \(z=x_3,\) etc. A matriz \(G= \left\{ g_{ij}\right\}\) é denominada a métrica do espaço. Observamos que a geometria euclidiana, em \(\Bbb R^3\), é um caso particular onde
$$\left\{ g_{ij}\right\} = \left\{ \delta_{ij}\right\}=\left\{
\begin{array}{lll}
1 & 0 & 0 \\
0 & 1 & 0 \\
0 & 0 & 1 \\
\end{array}
\right\}
$$
é a métrica de Euclides. Este formalismo foi utilizado por Albert Einstein em sua Teoria da Relatividade Geral.

História dos Números Complexos

As equações do segundo grau apareceram na Matemática aproximadamente 1700 anos antes de Cristo, registradas nas tabuletas de argila da Suméria. Em alguns casos elas levavam a raízes de números negativos que, em geral, eram descartadas. O primeiro exemplo de raiz de número negativo foi publicado, aproximadamente em 75 d.C. por Heron, em um cálculo sobre o desenho de uma pirâmide em que surge a necessidade de avaliar a raiz \(\sqrt{84-100}\). Heron, no entanto, simplesmente substituiu este número por \(\sqrt{100-84}\).

Capa de Aritmetica Diofanto, edição 1621

Aproximadamente no ano 275 d.C. Diofanto de Alexandria, resolvendo um problema geométrico, chegou à equação
$$24x^2 -172x+366=0$$
cujas raízes são \(x=(±43\sqrt{-167})/12\). Ele continuou sem dar maiores explicações sobre o significado da raiz de um número negativo. Por volta de 850 d.C. o matemático indiano Mahavira afirmou que “… como na natureza das coisas um negativo não é um quadrado, ele não tem, portanto raiz quadrada”. Bhaskara (1114 – 1185 aproximadamente) afirmou: “O quadrado de um afirmativo é um afirmativo; e a raiz quadrada de um afirmativo é dupla: positiva e negativa. Não há raiz quadrada de um negativo pois ele não é um quadrado.”

O matemático Luca Paccioli (1445 – 1514) publicou em 1494 que a equação \(x^2+c=bx\) é solúvel se \(b^2\ge 4c\) e o francês Nicola Chuquet (1445 – 1500) faz observações semelhantes sobre “soluções impossíveis” em uma publicação de 1484.

Gerônimo Cardano (1501 – 1576) considerava que o surgimento de radicais negativos na resolução de um problema apenas indicava que o mesmo não tinha solução, mas apesar disso resolveu um problema que consiste em dividir um segmento de comprimento 10 em duas partes tal que o produto delas seja 40, a partir da equação \(x(10-x)=40\) ou \(x^2-10x+40=0\), cujas soluções são \(x=5±\sqrt{-15}\). Cardano sustentava que esta equação não tem solução, mas observou que a soma das duas raízes é 10 e seu produto é 40, desde que se aceite que \((\sqrt{-15})^2=15\).

Embora a solução de equações do segundo grau já demandem a existência dos complexos, o reconhecimento da necessidade destes só surgiu na resolução da equações do terceiro grau, dos seguintes tipos:
$$x^3 + a x=b;\;\; x^3=ax+b \mbox { e } x^3+b=ax.$$

Em 1545 Cardano publicou uma fórmula para resolver equações do terceiro grau, que ficou conhecida por “Fórmula de Cardano”. Sabemos, no entanto, que ele recebeu de Tartaglia (1500 – 1557 aproximadamente) a sugestão para esta fórmula. Raphael Bombelli (1526 – 1573) um admirador de Cardano, decidiu escrever um livro sobre os mesmos assuntos procurando explorar o assunto com maior clareza, e o publicou em 1572. Neste livro, enquanto resolvia a equação \(x^3=15x+4\) pela fórmula de Cardano encontrou a raiz
$$x=\sqrt[3]{2 + \sqrt{-121} } + \sqrt[3]{2 – \sqrt{-121} },$$

solução desprezada por Cardano como sendo “irredutível”. Bombelli, no entanto, propôs o que ele mesmo chamou de “idéia louca”, a sugestão de que \(\sqrt{-1}\) pudesse ser usado matematicamente desde que observadas algumas regras (aquelas que hoje chamamos de álgebra dos complexos). Neste caso o número \(a+b \sqrt{-1}\) é raiz de \(2 + \sqrt{-121}\) se \(\left( a+b\sqrt{-1}\right)^3=2+\sqrt{-121}\) ou, após manipulação algébrica, \(a=2\) e \(b=1\). Desta forma a raíz citada acima pode ser escrita como
$$x= \left( 2+\sqrt{-1}\right) + \left( 2-\sqrt{-1}\right) =4,$$
uma solução real que pode ser verificada diretamente na equação cúbica a ser resolvida.

Uma das dificuldades que Bombelli se deparava era a de não possuir uma notação adequada para seus cálculos. Ele usava uma notação sincopada, uma forma resumida da descrição literal que era feita anteriormente. Por exemplo, ele escrevia
$$x=\sqrt[3]{2 + \sqrt{-121} } \;\; \mbox{ como } \;\; R_c \lfloor \lfloor 2p R_q \lfloor \lfloor 0 – 121 \rfloor\rfloor \,\rfloor\rfloor.$$

Observe que nesta época nem mesmo o entendimento dos números negativos estava totalmente consolidado, sendo que \(-121\) era escrito como \(0-121\). Mesmo assim ele pode mostrar o papel importante que os números conjugados complexos viriam a desempenhar no futuro. Efetivamente o símbolo \(\sqrt{-1}\) foi usado pela primeira vez por Albert Girard em 1629, quando enunciou claramente as relações entre raízes e coeficientes de uma equação.

O uso de \(i\) como unidade imaginária, \(i=\sqrt{-1}\), foi adotado por Euler em 1777, mas só publicado em 1794 em seu Institutionum calculi integralis. Ele observou na época que \(ii=-1\) o que leva à \(1/i=-i\). O símbolo se tornou amplamente aceito após seu uso por Gauss em 1801. Embora os termos real e imaginário já tivessem sido usados René Descartes em 1637, a expressão número complexo só foi introduzida por Gauss em 1832.

A partir do trabalho de Bombelli os números complexos passaram a ser usados, mesmo que se duvidasse de sua existência. A primeira tentativa para atribuir um significado concreto aos números complexos por meio de uma “interpretação geométrica” é devida a John Wallis (1616 – 1703) em um trabalho que discutia a impossibilidade da existência de quantidades imaginárias e comparando este tema com questão à existência de quantidades negativas.

Em 1702 Jean Bernoulli afirmou que um número e seu oposto tem o mesmo logaritmo. Esse fato intrigou os matemáticos do início do século XVIII, que não sabiam como atribuir um valor ao logaritmo de um número negativo. Coube a Euler, em 1747, explicar a questão em uma carta dirigida a d’Alembert.

Em 1707 Moivre publicou a solução da equação de grau ímpar, por um método análogo ao de Cardano. A fórmula de Moivre,
$$\left( \cos \theta +i\mbox{sen} \theta \right)^n = \cos (n \theta) +i\mbox{sen}(n\theta)$$
foi publicada em 1722 para alguns casos particulares do argumento [/latex]\theta[/latex]. Em1748 Euler, além de demonstrar a validade da fórmula para o caso geral, estendeu sua validade para todo expoente real, estabelecendo definitivamente a existência de raízes no campo complexo.

A formalização completa dos números complexos como pares ordenados de números reais foi desenvolvida em 1833 por Hamilton (1805 – 1865) e em 1847 por Cauchy (1789 – 1857).

Equações Diferenciais

Equações diferenciais são um ramo importante do cálculo e da análise matemática e representam, provavelmente, a parte da matemática que maior número de aplicações encontra na física e na engenharia. Sua história tem origem no início do cálculo, desenvolvido por Newton e Leibniz no século XVII. Equações que envolvem as derivadas de uma função desconhecida logo apareceram no cenário do cálculo, mas, com igual rapidez se constatou que elas não são sempre fáceis de serem resolvidas. As mais simples são aquelas que podem ser diretamente integradas, por meio do uso do método de separação de variáveis, desenvolvido por Jakob Bernoulli e generalizado por Leibniz.

No século XVIII muitas equações diferenciais começaram a surgir no contexto da física, astronomia e outras aplicações. A equação de Newton para a gravitação universal foi usada por Jakob Bernoulli para descrever a órbita dos planetas em torno do Sol. Já nesta época ele podia usar as coordenadas polares e conhecia a catenária como solução de algumas equações. Halley usou os mesmos princípios para estudar o movimento do cometa que hoje tem o seu nome. Johann Bernoulli, irmão de Jakob, foi um dos primeiros a usar os conceitos do cálculo para modelar matematicamente fenômenos físicos e usar equações diferenciais para encontrar suas soluções. Ricatti (1676 – 1754) levou a sério o estudo de uma equação particular que levou o seu nome e, mais tarde, foi também estudada pelos irmãos Bernoulli. Taylor foi o primeiro a usar o desenvolvimento de funções em séries de potência para encontrar soluções. Não havia, no entanto, uma teoria global ou unificada sobre esta técnica.

Adrien Marie Legendre

Leonhard Euler, o primeiro matemático a compreender profundamente o significado das funções exponencial, logaritmica e trigonométricas, desenvolveu procedimentos gerais para a solução de equações diferenciais. Além de usar as funções elementares ele desenvolveu novas funções, definidas através de suas séries de potências como soluções de equações dadas. Sua técnica dos coeficientes indeterminados foi uma das etapas deste desenvolvimento. Em 1739 Euler desenvolveu o método da variação dos parâmetros e, mais tarde, propôs técnicas numéricas que fornecem “soluções aproximadas” para quase todo o tipo de equação.

Posteriormente muitos outros estudiosos de dedicaram ao assunto, refinando e ampliando as técnicas de Euler. A trabalho de d’Alembert na física matemática permitiu que ele encontrasse soluções para algumas equações diferenciais parciais simples. Lagrange seguiu de perto os trabalhos de Euler e aperfeiçoou os estudos aplicados à mecânica, em particular no problema de três corpos e no estudo da energia potencial. Em1788 ele introduziu as equações gerais do movimento para sistemas dinâmicos, o que hoje é conhecido como as equações de Lagrange, onde fazia uso do chamado cálculo variacional. O trabalho de Laplace na estabilidade do sistema solar produziu novos avanços, incluindo para o uso de técnicas numéricas. Em 1799 ele apresentou o conceito do Laplaciano de uma função. Já o matemático Legendre trabalhou com equações diferenciais, primeiramente motivado pelo estudo do movimento de projéteis, examinando pela primeira vez a influência de fatores como a resistência do ar e velocidades iniciais. Muitos dos desenvolvimentos seguintes se referem às equações diferenciais parciais. Parte importante deste desenvolvimento foi obtida por Fourier em sua busca por soluções do problema de difusão do calor. Ele desenvolveu uma representação de funções sob a forma de séries infinitas de funções trigonométricas, úteis para o tratamento de equações parciais e diversas outras aplicações.

Até o início do século XIX o estudo das equações diferenciais, e do cálculo como um todo, padeciam de uma deficiência crônica no que se refere à fundamentação teórica de seus princípios. Esta fundamentação começou então a ser construída, iniciando pelo entendimento da teoria e conceitos das funções de variáveis complexas. Gauss e Cauchy foram os principais responsáveis por estes avanços. Gauss usou equações diferenciais para aprimorar as teorias de órbitas e da gravitação planetárias e estabeleceu a teoria do potencial como parte importante da matemática. Ele mostrou que as funções de variáveis complexas eram a chave para compreender muitos dos resultados exigidos pelas equações diferenciais. Cauchy usou equações diferenciais para modelar a propagação das ondas na superfície de um líquido. Ele foi o primeiro a definir de forma satisfatória a noção de convergência de uma série infinita, dando início à análise rigorosa do cálculo e das equações diferenciais. Cauchy também desenvolveu uma teoria sistemática para os números complexos e a usou a transformada de Fourier para encontrar soluções algébricas para as equações diferenciais. A solução de equações diferenciais nas proximidades de um ponto singular foi elaborada por Frobenius.

Muitas outras contribuições têm sido acumuladas ao longo da história mais recente. Poisson utilizou as técnicas das equações diferenciais a aplicações na física e em sistemas mecânicos, incluindo a elasticidade e vibrações. Green aperfeiçoou os fundamentos da matemática utilizada em aplicações da gravitação, da eletricidade e do magnetismo. Baseados nestes fundamentos Thomson, Stokes, Rayleigh e Maxwell, construiram a teoria moderna do eletromagnetismo. Bessel utilizou a teoria das equações para o estudo da astronomia, buscando analisar perturbações dos planetas sobre as suas órbitas. Joseph Liouville foi o primeiro a resolver problemas de valor de contorno usando equações integrais, um método mais tarde aperfeiçoado Fredholm e Hilbert.

Em meados do século XIX novas ferramentas se tornaram necessárias para a solução de sistemas de equações diferenciais. Jacobi desenvolveu a teoria dos determinantes e transformações para a solução de integrais múltipla e equações diferenciais. O conceito de jacobiano de uma transformação foi elaborado em 1841. Cayley também contribuiu para teoria das matrizes e determinantes publicando diversos artigos sobre matemática teórica, dinâmica e astronomia. Gibbs estudou a termodinâmica, eletromagnetismo e mecânica, sendo considerado a pai da análise vetorial.

Os avanços durante o final do século XIX adquiriram uma natureza cada vez mais teórica. Em 1876 Lipschitz obteve a prova dos teoremas de existência para equações de primeira ordem. Uma contribuição importante para o estudo das equações diferenciais, apesar de não imediatamente reconhecida pela comunidade dos matemáticos devido a sua falta de rigor, foi feita por Oliver Heaviside. Entre 1880 e 1887 ele desenvolveu o cálculo operacional e o uso da transformada de Laplace para reduzir equações diferenciais a equações algébricas de solução muito mais simples. Como vantagem adicional seu formalismo permite o tratamento de sistemas com entradas descontínuas e é extensamente usado na engenharia, especialmente na eletrônica e no tratamento de sinais.

No século XX os maiores impulsos vieram do desenvolvimento de métodos numéricos mais eficientes e da consideração de equações e sistemas de equações diferenciais não lineares. Carl Runge desenvolveu um método para resolver equações associadas à mecânica quântica, atualmente conhecido como método de Runge-Kutta. O outro tema permanece em aberto e recebendo contribuições importantes até o presente. Muitos fenônenos naturais são descritos por equações não lineares. Uma das características destes sistemas consiste na dependência muito sensível das condições iniciais, o que gera comportamentos de difícil previsibilidade que têm sido denominados de caos. Um exemplo importante de sistema não linear é o sistema de equações que descreve o movimento de muitos corpos, por exemplo na descrição do movimento planetário no sistema solar. Outros sistemas não lineares representam o crescimento de espécies em competição, o fluxo turbulento de fluidos, a descrição das condições meteorológicas, entre outros. Henry Poincaré (1854 – 1912), matemático, físico e filósofo da ciência foi um dos precursores deste assunto, sendo o primeiro a descobrir o comportamento caótico das soluções para sistemas de três corpos. Liapunov, Lorenz e muitos outros matemáticos trabalharam nesta área que continua em franca expansão e é de se esperar que o progresso nesta área traga grandes inovações na descrição de diversas áreas do conhecimento.

História dos Símbolos

História dos Símbolos Matemáticos

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